03/12/2012

Uma Onça na Cidade

Uma onça na cidade
Autor: Claudeir da Silva Martins
Obra registrada na Fundação Biblioteca Nacional.



Cidade, bela cidade... Com seus prédios e edifícios altos,
arranha-céus extraordinários, uma magnífica arquitetura que os mantém
de pé em uma verdadeira selva de pedras.


– A cidade não para de crescer – Disse um caipira a um homem da cidade.

Construções e mais construções, casas e mais casas, a cada dia que se
passa mais e mais residências são erguidas. Ouve-se o barulho da
motosserra, do trator e do caminhão... são os madeireiros derrubando a
selva para ampliar o tamanho da cidade.

As indústrias estão chegando, derrubem as árvores e construam mais
bairros, alojamentos, prédios e edifícios, pois de trabalhadores
precisaremos.

Com machado se corta a árvore e tão pouco se preocupa se ela é ou não
importante, se é ou não um ser vivo, se deve ou não ser respeitada.
Afinal de contas... Onde estão os direitos das árvores quando mais se
precisa deles?

Cansada de ver seu habitat violado e cansada de ter que mudar cada vez
para mais longe, Dona Onça, muito irritada logo exclama:

– Até quando! Até quando! Até quando vou ficar fugindo e me mudando?

– Os homens derrubam as árvores e nos expulsam de nosso
território, se não agirmos, logo não teremos mais ecossistema – Disse
mais a onça.

– Não dá para enfrentá-los com aqueles verdadeiros monstros com os
quais entram na floresta – Disse a jaguatirica, referindo-se a palavra
monstros aos caminhões, tratores e motosserras que os madeireiros
usavam para derrubar as árvores.

– Suçuarana e jaguatirica, ouçam o que tenho a dizer, pois isto é
importante – Afirmou a onça pintada.

– Sim, estamos ouvindo – Disseram ambas a onça.

– Se esses homens estão derrubando nossa floresta, o que acha de nos
mudarmos para a selva deles – Disse a onça pintada.

– Mudar para a selva de pedras! Ficou louca, amiga? – Perguntou a suçuarana.

– Louca está você de ficar aqui com as patas cruzadas enquanto os
homens derrubam nosso ecossistema – Contradisse a onça.

– Ecologia, nicho ecológico e meio-ambiente! Do que servem essas
palavras se os homens não sabem respeita-las – Disse a jaguatirica.

– É por isso que devemos nos mudar para a selva de pedras para
fazermos algo a respeito – Indagou a onça pintada.

– Vá você então, amiga! E leve suas pintas contigo – Disse a jaguatirica.

Então a onça pintada mudou-se para a selva de pedras e montanhas de
aço, pois foi inútil tentar convencer suas amigas a ajudarem com seu
plano de convencer os homens a parar de destruir a floresta.

A onça pintada precisou tomar muito cuidado ao atravessar as avenidas,
ruas e viadutos da selva de pedras, pois todo o cuidado era pouco.

– Criaturas abomináveis são essas tartarugas de aço, as quais andam
mais rápido que meu primo leopardo – Declarou a onça, muito espantada
ao ver a velocidade com que os carros e motos andavam pelas ruas.

– Uma onça, pai! Uma onça! – Exclamou um menininho de dentro de um carro.

– Imaginação, filho! Imaginação! – Exclamou o pai, respondendo ao seu filho.

– Não pai! Eu vi e ela está vindo para perto do carro – Disse o menino.

– Há – há – há – há – Gostaria de saber o que as crianças andam
assistindo hoje em dia – Disse o pai, com seu fusca estacionado na rua
treze, uma das principais ruas do centro.

A onça se aproximou de mansinho e perguntou para o homem:

– Gostaria de saber por que andas numa tartaruga de aço, que solta
bafo preto e fedorento que me dá náuseas?

– Haaaaaaaarrrrrr... Vamos embora! Vamos embora, filho! – Gritou o
pai, dando partida no carro e indo embora há mais de cem por hora.

– Vejo que esses homens não entendem felinês, língua de felino, né –
Concluiu a onça, muito espantada.

– Mas o que é aquela enorme e extensa cobra de aço, que se move com
grande rapidez ao longo daquele caminho? – Perguntou-se a onça,
referindo-se o termo cobra de aço ao famoso metrô.

– Não sei se isso morde mas vou subir na sua cauda – Declarou a onça,
saltando para cima do ultimo vagão do metrô.

De cima do vagão, a onça escutou uma conversa vinda de dentro do
vagão, a qual era a seguinte:

– Há rumores de que uma onça esteja andando na cidade.

– Mas o que um bicho desses veio fazer aqui?

A onça, espantada, disse para si mesma:

– Caramba! Não faz nem um dia que estou na selva de pedras e já sou famosa.

Continuando a conversa no vagão...

– Meu deus! Isso é perigoso, e vai que um bicho desses morde uma
criança – Disse uma senhora, assustada.

– Eu, morder uma criança! Isso não faz parte da minha natureza –
Replicou a onça, descendo para dentro do vagão.

– Haaaaaarrrrrr... – Assim gritavam os passageiros do metrô.

– Calma! Calma! Sou apenas mais uma passageira nesse monstro de aço –
Explicou a onça.

Para a sorte dos passageiros, o metrô parou e os passageiros saíram
correndo amontoados para fora dos vagões. A policia, os bombeiros,
exército, marinha, força aérea, Ibama e tropa de elite foram
acionados, tudo para capturarem essa onça, a qual estava dentro do
trem.

– Minha santa pinta! Eles querem me caçar – Exclamou a onça pintada,
muito assustada, achando que os homens iriam caçá-la quando na verdade
só queriam dopá-la com dardos soníferos, para depois enjaula-la numa
jaula de aço com cadeado que não enferruja.

A onça não se deteve e fugiu para cima das casas, e de casa em casa
ela foi pulando, causando muita confusão e latido dos cachorros da
vizinhança, os quais latiam o seguinte:

– Gato grande! Gato grande! Ai se eu pego um... Coitado desse gato grande.
A onça foi parar em cima de um edifício, onde não soube mais descer,
desesperada ela disse:

– Ai, ai, ai, ai! Esse é meu fim, é hoje que viro casaco de onça ou
bolsa de mulher.

Vieram uns helicópteros voando, era a imprensa que estava filmando a pobre onça.

– O que uma onça faz na cidade? O que trouxe um felino desses para cá?
– Assim perguntavam os repórteres, doidos para filmarem e
entrevistarem a onça, lógico se isso fosse possível.

– O que fazes aqui, prima? – Perguntou um gato persa de pelos amarelos
dourados, cujo nome é coragem.

– Decidi vir para a selva de pedras para convencer os homens a não
derrubarem mais árvores, mas vejo que acabarei com minha cabeça num
mostruário ou então numa jaula de circo e quem sabe se minha
condenação for mais amena eu não vou parar num zoológico ou safári –
Disse a onça.

– Que isso, prima! Pra que tanto desespero assim, se entregue e diga
aos repórteres o que a motivou a vir para a cidade, defenda seus
direitos de felino, ou melhor, seus direitos de bicho, defenda seu
ecossistema e quem sabe os homens não se conscientizam de parar com
essa barbaridade – Declarou o gato, enquanto lambia a pata da onça.

– Você é mesmo fofinho, mas como vou defender meus direitos se não
conheço nada de lei e tão pouco sei falar língua de homem? – Perguntou
a onça ao gato.

– Há, há! Para isso não há problema, minha prima! Eu sou o melhor
advogado dos gatos e coragem é meu nome, é sim, é sim! – Declarou o
gato, doido para uma briga nos tribunais.

– Ótimo! Um felino que sabe advogar, mas de que adianta saber advogar
se não conheces língua de homem – Disse a onça.

– Isso não é problema para mim! Meu dono é um grande inventor, e uma
das melhores invenções sua foi o: “Aparelho falador e tradutor de
língua de bicho para língua de homem”. – Afirmou o gato persa, em tom
de exaltação.

– O que! Aparelho falador e tradutor de língua de bicho para língua de
homem, mas que nome mais comprido esse homem deu para uma coisa
dessas! – Declarou a onça, espantada.

– Não importa! Use agora, me deixe coloca-lo no seu pescoço – Disse o
gato, colocando a coleira falatória na onça.

A onça então se deixou ser capturada e enjaulada, tudo isso só para
ter uma oportunidade de falar com a imprensa. Os jornalistas e
curiosos se aproximaram da jaula, para verem aquela fera, só que não
sabiam ainda o motivo de ela estar usando aquela coleira no pescoço.

– Veja! Ela usa uma coleira, talvez seja uma onça que fugiu do
zoológico – Disse um jornalista.

– Talvez seja uma fugitiva de uma reserva florestal – Opinou um morador.

– Talvez os cientistas tenham colocado essa coleira nela para saberem
das suas pegadas, por onde esteve e para onde foi – Disse uma mulher.

– Basta! – Exclamou a onça em alta voz, deixando todo mundo espantado.

– Não é possível isso, o bicho falou! – Disse um menino espantado.

– Deve ter sido só uma impressão em massa – Declarou um psicólogo.

– Não! Não! E mil vezes não! – Replicou a onça.

– Ela falou outra vez, vejam só, o bicho sabe falar – Disse o
Cameraman enquanto dava um zoom na cara da bicha.

Vendo que a bichana falava e tinha a língua solta, a imprensa logo
começou a interrogar e perguntar:

– Dona onça! O que veio fazer na cidade?

– Dona onça! O que perdeu na selva?

– Dona onça! A cidade é muito linda?

– Dona onça! Veio arranjar namorado?

– Dona onça! Lugar de onça não é na cidade.

– Dona onça! Vossa senhoria não deveria estar aqui.

– Dona onça! O que a trouxe aqui?

Eram tantas perguntas que deixou a onça meio zonza, mas ela respondeu.

– Me chamo onça, e meu codinome é pintada, formando onça pintada. Por
que vim para a cidade, boa pergunta, porque vocês estão destruindo meu
habitat – Respondeu a onça, injuriada.

Todo mundo ficou calado e de boca aberta, pois a onça estava certa, a
onça tinha razão, a onça pensava, a onça raciocinava como gente.

– E pensar que um bicho desses não sabia falar – Declarou o repórter.

– Pelo amor de Deus! Parem de derrubar a floresta, pois toda vez que
vocês fizerem isso, sem habitat e ecossistema ficaremos e juntos
mudaremos para a selva de pedras – Discursou a onça, como se lá
estivessem todos os bichos selva.

– Cada árvore que vocês derrubam, é uma família de macacos pregos a
menos! Cada planta cortada é uma espécie de inseto ou hortaliça a
menos, e sabem quem se prejudicará mais nessa história? – Perguntou a
onça em tom de braveza e ousadia.

– Quem! Quem! Quem! Quem? – Perguntou todo mundo ao mesmo tempo, em sincronia.

– Os homens, pois faltará plantas que curam, insetos controladores de
pragas e ainda por cima terão que conviver com animais selvagens na
selva de pedras, e ai eu quero ver, para onde irão correr – Declarou a
onça pintada, finalizando seu mini-discurso, o qual não era um
discurso tão bom como o do presidente de uma nação, mas que
conscientizou a mídia, imprensa e sociedade, para juntos pararem os
madeireiros e mega industrias que só pensavam em derrubar, derrubar e
derrubar.

No dia seguinte a onça foi solta, e junto com seu namorado, coragem, o
gato persa, ela lutou, chorou e clamou pelos direitos dos bichos na
televisão, radio e jornais, conscientizando os homens de que destruir
era errado, que ao invés disso, eles deveriam reciclar seu próprio
lixo e evitar derrubar árvores.

Dona onça e o grande advogado doutor coragem fundaram uma associação,
cujo nome era exército verde, onde muitos humanos se uniram para
plantarem árvores onde havia árvores derrubadas.

O resultado disso foi que tanto a selva de pedras quanto a selva de
árvores ficaram lindas e arborizadas outra vez, tornando tanto a vida
dos homens quanto dos animais melhor e mais saudável, e então a onça
voltou para a floresta, muito contente com suas reformas e com seu
novo namorado e terminou o conto.


Aqui esta o link para abaixar meu conto em formato PDF de forma gratuita
http://www.multiajuda.com.br/livro.php?id=14574&n=Uma+on%E7a+na+cidade

Um comentário:

Anônimo disse...

Estou muito agradecido em ver minha história publicada nesse blog maravilhoso! Muito obrigado professor Evandro. Um forte abraço pra todos que lerem, compartilharem e curtirem. Muito obrigado!

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